11 de outubro de 2010

Especial: I Festival Internacional da Canção (1966)

I Festival Internacional da Canção (1966)

Maysa na grande final brasileira do festival, em 25 de outubro de 1966


Maysa não poderia sequer imaginar o que a aguardava no I Festival Internacional da Canção. Seria um dos momentos mais inesquecíveis de toda sua carreira. O concurso musical criado por Augusto Marzagão com apoio da secretaria de turismo do estado da Guanabara, foi exibido pelas TVs Rio (primeira edição) e Globo. O festival consistia em duas fases: a primeira – nacional –, que decidiria a candidata do Brasil na fase internacional e uma segunda e última – internacional – que consistia na grande final do evento. A primeira edição do evento se realizaria em outubro daquele ano de 1966  no ginásio do Maracanãzinho, contando com nomes estelares da música brasileira como Maysa e Elis Regina. E também artistas internacionais de renome, vindos de vários países. Alguns dos nomes deixam claro a que veio o FIC – Judy Garland, Amália Rodrigues e Jean Sablon – eram alguns dos convidados internacionais deste primeiro FIC.
Em jogo, além dos prêmios em dinheiro estava também o troféu Galo de Ouro, uma estatueta desenhada por Ziraldo com olhos de brilhantes, cauda de turmalinas e crista cravejada por rubis. Definido em 2 eliminatórias, Maysa apresentou-se na segunda e última defendendo a marcha-rancho “Dia das Rosas” do violonista Luiz Bonfá e de sua mulher Maria Helena Toledo no dia 23 de outubro de 1966. A canção logo alcançou um grande êxito animando a platéia de aproximadamente 5 mil pessoas, mais o grande destaque sem dúvidas foi o novo visual de Maysa, como ressaltou a Última Hora na edição do dia 24: “Maysa foi um espetáculo a parte, ao exibir-se ontem no Festival Internacional da Canção Popular para defender com êxito, a canção “Dia das Rosas” de Luís Bonfá e Maria Helena Toledo. Tostada de Sol, ela cantou e encantou na noite carioca. O júri composto por nomes como Elizeth Cardoso, Roberto Menescal, Chico Buarque e Henrique Pongetti logo questionou a acústica horrenda do estádio. Esta, seria de longe uma das maiores críticas ao FIC durante sua existência, entra ano e sai ano, tentaram de todas as formas algum tipo de melhora que nunca foi alcançada. O esquema continuou o mesmo desde a primeira até a última edição – a orquestra não ouvia o intérprete, o intérprete não ouvia a orquestra e ninguém ouvia ninguém (!).
A grande final brasileira, marcada para o dia 24 de outubro prometia fortes emoções que não demoraram muito a se concretizar. Dos catorze finalistas, Maysa foi a décima a subir ao palco do Maracanãzinho quando já era noite alta. Estava belíssima, sorridente e bronzeada pelo Sol carioca, logo levantaria a platéia de aproximadamente 5 mil pessoas com uma esfuziante interpretação de “Dia das Rosas”, acompanhada pelo maestro Eumir Deodato que fizera com ela o histórico show no Au Bon Gourmet 3 anos antes e viera especialmente dos Estados Unidos para acompanha-la junto com Claudette Soares. Naquele instante “Dia das Rosas” já havia se firmado como a favorita do público para campeã, mas também havia outras grandes favoritas. Dentre estas, 6 se destacaram junto ao público. “O Cavaleiro” de Geraldo Vandré e Tuca, interpretada pela rechonchuda cantora e compositora encabeçava a lista das favoritas, ao lado de “Não Se Morre de Mal de Amor” de Reginaldo Bessa, na voz do censurado Taiguara. Outra que mereceu destaque naquela final do I FIC foi “Inaiá” de Luís Carlos Sá, mais conhecido como integrante da dupla Sá & Guarabyra, Claudette Soares também empolgou a platéia do ginásio com “Chorar e Cantar” de Vera Brasil e Sivan Netto. Mas, uma das maiores surpresas da noite foi o garoto Bilinho, filho de Billy Blanco cantando “Se a Gente Grande Soubesse” de autoria do próprio pai com acompanhamento do Quarteto em Cy. Até ali já estava nítido que o Brasil seria representado por Tuca ou Maysa, pois mais nenhum intérprete teve a mesma comoção popular que a interpretação das duas cantoras.
Elis Regina com “Canto Triste” de Edu Lobo e Vinicius de Moraes foi recebida sem maiores delongas, assim como a futura campeã “Saveiros”, por Nana Caymmi. Ali mesmo naquela noite, instituiu-se a vedete oficial do Festival Internacional da Canção – a vaia em festival – dali por diante ela seria presença constante em todas as edições como um “termômetro” da platéia. E naquela primeira edição, coube a Miltinho esta amarga sensação. O público até gostou quando no começo da apresentação um grupo de passistas e cabrochas adentraram o palco do Maracanãzinho, mas passou a berrar quando Miltinho cantou “Apoteose do Samba” de Herivelto Martins e Klécius Caldas, a chuva de vaias foi tanta que acabou com a apresentação. Já era madrugada do dia 25 de outubro quando finalmente anunciou-se a lista dos vencedores em ordem decrescente, à hora, a expectativa era imensa. Tuca e Maysa precisaram até ser atendidas pela equipe médica presente no local – Tuca simplesmente pelo excesso de nervosismo, mas Maysa passara mal de verdade após os litros de whisky ingeridos nos camarins do ginásio antes de sua apresentação – ressabiada, logo acusou: “Whisky não faz isso comigo, alguém colocou alguma coisa na minha bebida” – Maysa teve de ser amparada pelos colegas na hora da anunciação. Após minutos de suspense a voz do locutor Hilton Gomes informou pelos alto-falantes do Maracanãzinho que “Dia das Rosas” conquistara a terceira colocação. Naquele exato momento o Maracanãzinho veio abaixo, junto com Maysa que ainda desnorteada demorou em perceber que as estrepitosas vaias eram para o jure. Após se acalmar, foi ao microfone e interpretou a marcha-rancho sob chuvas de aplausos consagradores. Ninguém poderia acreditar que o segundo lugar ficaria com a entusiasmada “O Cavaleiro” de Geraldo Vandré e Tuca, o Maracanãzinho novamente ameaçou ruir. “Saveiros” dos desconhecidos Dory Caymmi e Nelson Motta na voz de Nana Caymmi havia conquistado o primeiríssimo lugar, sob mais uma chuva de vaias para a duvidosa decisão do jure, ninguém conseguia ouvir a voz de Nana, revoltada, Maysa saiu do seu lugar e mesmo cambaleante exigiu às arquibancadas aplausos para a vencedora da grande final brasileira.
No fim da final internacional, Maysa foi saudada como a melhor intérprete brasileira do FIC I, no intervalo após receber o prêmio cantou “Dia das Rosas” novamente sob uma festa de aplausos e gritos inconformados de “é campeã, é campeã!”. A cantora alemã Inge Brück sagrou-se a grande campeã do festival, levando o Galo de Ouro para a Alemanha Ocidental com a canção “Frag den Wind”, de seus compatriotas Helmut Zacharias e Carl Schauber, “Saveiros” ficara em segundo lugar na classificação geral e foi novamente vaiada. No dia seguinte, na luxuosa Pérgula do Copacabana Palace, quando os jornalistas perguntaram a Inge Brück  o que havia achado da premiação, ela afirmou estar muito feliz , mas fez uma única ponderação: “Se Maysa tivesse concorrido na parte internacional, sem dúvida ela tiraria o primeiro lugar.” Enquanto cantarolava a melodia de Luiz Bonfá e Maria Helena Toledo. David Raskin da Associação Americana de Compositores para Cinema e Teatro, e Helmut Zacharias fizeram coro as afirmações de Brück sobre Maysa. Enquanto toda a imprensa internacional saudava Maysa como o grande nome do FIC I, os repórteres brasileiros ignoravam e tinham a cara de pau de perguntar a Maysa se era verdade que ela cantara alcoolizada. A resposta foi curta e grossa:
“Sim, eu bebi. Ninguém tem nada com isso. Anotem aí: eu bebo porque gosto de beber.”
Mesmo com todas as desventuras e destemperos do Festival – sem qualquer sombra de dúvida – Maysa sagrou-se a grande estrela do primeiro Festival Internacional da Canção. Mas ela não ficaria por muito mais tempo no Brasil, em breve iria voltaria a zanzar pelo mundo, buscando mares nunca dantes navegados.




Última Hora – 24/10/1966

Última Hora – 25/10/1966

Última Hora – 25/10/1966

As grandes vencedoras da final brasileira do Festival: Tuca, Nana Caymmi e Maysa

Painel FIC I:
Tuca, Nana Caymmi e Maysa
Henry Mancini e Chico Buarque
Nana Caymmi e Inge Brück
Henry Mancini e Nara Leão
Laurindo de Almeida e Vinicius de Moraes
Dory Caymmi e Nelson Motta

2 comentários:

  1. Incrível postagem. Bem contada, sem muitas delongas. Maysa com certeza podia ter vencido. xD

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  2. Olá Vitor, gostei muito desta postagem....E com toda certeza a favorita do público era Maysa, sem apologias, mas Maysa é Maysa... merecia o primeiríssimo lugar.........
    Se não levou o troféu, levou o carinho do público que vale mais que muitos prêmios....bjosssssssss

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