22 de janeiro de 2014

Especial: 37 anos sem Maysa


37 anos sem Maysa


Maysa. Apenas um nome – e que nome. Quantos artistas têm o privilégio de ter suas personalidades completamente indissociáveis de nomes comuns? Poucos, Maysa foi um deles. Mas nem sempre foi assim. A mulher que nasceu Monjardim e um dia foi Matarazzo, precisou de muita coragem para se livrar dos pesados grilhões que a acorrentavam, para poder enfim se tornar simplesmente Maysa. Nada foi fácil, tudo teve um preço muito caro. Numa época em que ser cantora era amoral, mal visto, Maysa foi cantora. Numa época em que ser compositora num ambiente estritamente masculino era incomum, Maysa foi compositora. Numa época em que ser separada do marido era uma aberração, Maysa desquitou-se. Não foi apenas ótima cantora, compositora, intérprete; foi muito mais que isso. Era uma mulher à frente do seu tempo, que não hesitou em romper barreiras, quebrar tabus e ir além. Isso por satisfação pessoal, de espírito, antes das bandeiras e dos partidos. Precisaram existir muitas ‘Maysas’ para que alcançássemos o grau de autonomia e liberdade de ação e pensamento que nossa sociedade possui hoje em dia. Há exatamente 37 anos atrás ela foi embora deste mundo para deixar de ser cantora, compositora, intérprete, atriz, pintora, poeta e ser apenas uma estrela reluzente no céu; porque, afinal, Maysa era muito maior do que o que todas as expressões artísticas poderiam lhe oferecer, e era evidente que sua trajetória tão densa poderia ser interrompida fatalmente por um choque violento, como um cometa. Ela precisava de uma dimensão estelar. Finalmente foi encontra-la no espaço sideral, que é gigantesco e infinito, um pouco como a própria Maysa.


Os três mal amados
João Cabral de Melo Neto

O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato
O amor comeu minha certidão de idade, minha genealogia,
meu endereço
O amor comeu meus cartões de visita, o amor veio
e comeu todos os papéis onde eu escrevo meu nome
O amor comeu minhas roupas, meus lenços e minhas camisas,
O amor comeu metros e metros de gravatas
O amor comeu a medida de meus ternos,
o número de meus sapatos, o tamanho de meus chapéus
O amor comeu minha altura, meu peso, a cor de meus olhos
e de meus cabelos 
O amor comeu minha paz e minha guerra,
meu dia e minha noite, meu inverno e meu verão
Comeu meu silêncio, minha dor de cabeça,
meu medo da morte




Descanse em paz, Maysa



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